segunda-feira, 10 de novembro de 2014

Academia de Drags — Episódio 4

OBS: Logo reposto as ilustrações finalizadas. Por enquanto, vai à lápis mesmo.



Quarta semana chega e com ela vem uma qualidade maior em Academia de Drags. Qualidade essa que pode ser vista nas discussões do grupo, na desenvoltura de nossa hostess belí... nossa hostess Silvetty Montilla, no desenvolvimento das performances, entre outras coisinhas.

O episódio começa com um debate sobre o que é ser drag, sobre o papel desse artista na sociedade, sobre os dilemas enfrentados pelos gays, e claro que a polêmica Rita Von Hunty não poderia estar de fora. Sempre com argumentos estoicos, fiel aos seus princípios, Rita define em poucas palavras o que é ser uma drag queen:

"Desde os anos 60, 50 pra cá, para o gay ser aceito na comunidade ele se masculinizou. Uma drag queen rompe todo o conceito vigente misógino da nossa sociedade. A nossa sociedade favorece o macho alfa e oprime a fêmea. Nós somos artistas que vangloriamos a fêmea."

Tá, não foram tão poucas palavras assim, mas o conceito é o que vale. Rita cita também a definição que eu havia mencionado no texto anterior. Drag significa DRessed As a Girl (Vestido como uma garota). Garotas têm seus mais variados estilos. Por que, então, drag queens precisam seguir o mesmo? Qual seria a graça? Se arte fosse algo padronizado, não mereceria o título Arte. Entendo que discussões existem e sempre existirão, caso contrário seríamos todos um bando de conformados sem opinião, mas particularmente acho ridículo considerar a pauta "Arte realmente pode tudo?" como uma dicussão válida. Caramba, arte é cor, cor é mutável, mutação é evolução, evoluir é viajar, viagens têm inúmeros sabores, um sabor te proporciona uma miríade de sensações. A arte, então, precisa ser sentida. Quando ela toca seu coração, sua alma, é quando você entender qual é a arte que te move. Seu estilo, seu conceito é você quem define.

Academia de Drags alcançou um ponto além do entretenimento. Os debates gerados a partir do que vemos nos episódios são importantes para podermos esclarecer de uma vez o que é uma Drag Queen — inclusive entre as próprias Drag Queens. Ainda há preconceito dentro do meio, imagine fora. Quando Musa entrou no programa, imaginei "Bicha, a senhora é destruidora mesmo, viu, viado?". Como artista o é. Mas quando pretendeu rotular a arte drag, quando quis enfiar Rita em uma caixa e, de forma velada, ditar o que precisa ser feito para agradar os juízes, senti algo quebrar aqui dentro. Os juízes precisam aprender a criticar as queens dentro de seus próprios estilos. Bianca Del Rio provou na sexta temporada de RuPaul's Drag Race que é possível sim manter-se fiel ao seu personagem e conquistar uma coroa. Não que uma coroa vá enfatizar que você é melhor do que suas concorrentes.


Voltando ao teor leve da Academia, Rick Callado vem fazendo jus ao seu sobrenome e, seguindo a proposta do mini-desafio, faz mímicas para que as meninas descubram o nome do filme. Rick é muito fofo. Acompanho seu Facebook, Instagram, Twitter (e pelo binóculo escondido atrás do muro de sua casa) e percebo que o cara está malhando duro para estar trincado na próxima temporada. Poderemos então, finalmente, ver um Rick sem camisa, só de cuequinha, como um Pit Crew de um só deve ser. Mal posso ver para esperar 

Rita é a vencedora do desafio, e tem como "prêmio" definir os grupos e personagens de uma cena que será refeita no palco como desafio principal. Os grupos são Rita, Xantara e Yasmin em um, e Gysella, Musa e Lavynia no outro. A cena precisa conter o menino drag, a mãe conservadora, e a madre drag superiora.

Rita define os papéis de seu grupo, e também os do outro. Senti em Lavynia um derrotismo precoce, um mal sinal em competições do tipo. Se você já desiste antes mesmo de começar, multiplica suas chances de falha. Que tenha sido ou não estratégia de Rita, mas se você é bom, é bom e pronto. Reclamar não adianta. Sua mãe não está ali para que você possa esconder-se sob sua saia ou pedir socorro. Encare os desafios de peito estufado. Nem sempre conseguimos o papel que queremos — e falo também dos papéis reais do dia-a-dia —, mas cabe somente a nós tomar a frente do palco e fazer nosso brilho encantar a platéia. Mesmo que você seja a árvore no canto do cenário: seja a porra de uma árvore linda pra cacete, a melhor e mais alta de todas. Portanto, o discurso de Lavynia sobre o rumo que a competição tomou para ela naquele instante, para mim, é blá blá blá sem fundamento. Desculpa, gata.


Os professores da semana são Titi Muller e Luís Vaz, atores que fizeram parte do elenco do filme Do Lado de Fora (2014), junto com Silvetty Montilla, para lecionar Interpretação. Como os próprios assumem assim que entram que não são atores profissionais, as dicas que dão de primeira não parecem fazer sentido; parecem algo que vemos em qualquer grupinho de teatro de bairro. MAS então consegui enxergar sua estratégia, e a língua que escolhem falar para ajudar as queens é adequada a quem não é ator profissional. Poderiam muito bem chegar com técnicas decoradas e dicas ensaiadas e nos passar a imagem de os novos Lima Duarte e Fernanda Montenegro, mas não. A postura que adotam é atual, de um frescor que cativa os novos artistas. Ótima escolha, produção da Academia.


Silvetíssima vem ao palco num look estonteante. Ela está belí... ela está lá no palco. Algo que notei na Silvetty, no decorrer dos episódios, é que a roteirização que parecia matar sua persona acabou morrendo sob a própria persona. Em todo o episódio, desde o tablet sobre a mala do Rick, a abertura do desafio principal, a discussão no painel de jurados até o fechamento, pode-se ver algo mais próximo da Silvetty que tanto amamos. Está longe ainda daquela megera que fica gongando metade da boate, ou mandando as criaturas tomarem no edí, mas está bem melhor do que no primeiro episódio. Ainda sinto certo despreparo para julgar. Não que não saiba do que está falando, pois Silvetty é macaca velha e entende o que funciona ou não na noite, mas faltam os termos certos, as palavras certas para transmitir as críticas que ela pretende passar às competidoras. Estamos na primeira temporada, e tenho certeza que mama Sil vai chegar lá, da mesma forma que conseguiu chegar entre as 10 mais.

O primeiro grupo traz uma performance voltada ao humor. Espertas. Faça o público rir, e você está no rumo certo. O segundo puxa para um lado mais sério, mais próximo à cena do filme, ainda que contenha algum tom cômico (bem de leve). Decidi analisar cada uma delas, não somente em relação à desenvoltura no palco, mas no episódio em si e no desenvolvimento durante a competição.


Gysella Popovick nos dá aperitivos do quão bagaceira é (no bom sentido, claro, como a própria frizou no confessionário). Não sei se bagaceira seria o termo correto, mas "povão" se aproximaria mais. Gysella tem a pegada de uma Top Drag, mas com necessidade de um polimento. Coisinhas como "Deixa uma pra mim, filadaputa", "Bicha, a senhora é destruidora mesmo", e não conhecer mais da metade dos filmes citados me fez rir aos montes. É um humor puro, autêntico, algo que faz parte da pessoa, e a naturalidade o torna engraçado. Até o momento Gysella não me impressionou, não saiu da zona de conforto. Pelo que notei, está progredindo pelas beiradas, ou seja, avançando na competição sem apresentar nada memorável. Essa estratégia não a desmerece. Acho até esperto de sua parte. Mas qual a graça, para o próprio artista, em chegar à final sem criar um vínculo com o público? No desafio principal, não achei que sua performance foi tão boa quanto Yasmin, como os jurados apontaram. Ela foi inteligente ao explorar seu ponto forte (look, dublagem e bate cabelo).


Xantara Thompson vem crescendo bastante. De todas é a que tem os looks mais bem acabados, tanto que venceu o desafio da primeira semana. Demorou pra pegar no tranco, mas quando pegou não parou mais. Até o momento não consigo apontar pontos baixos em Xantara. A discussão sobre o suposto copy&paste do primeiro episódio, onde ela teria copiado Raja, da terceira temporada de RPDR (por favor!), foi esquecido após tantas provas de seu preparo. Para uma drag de Brasília, onde ela mesma disse que não há um enfoque tão grande no artista drag como há em São Paulo, a bicha arrasa e merece públicos e palcos bem maiores. No desafio principal merecia ter vencido junto com Yasmin, pois manteve-se na personagem o tempo todo e me fez rir desde que entrou até quando saiu.

Rita Von Hunty é a polêmica da temporada. Você olha para Rita e consegue imaginar dez formas de iniciar um debate. Adoro falar sobre ela, o que não deve ser segredo para ninguém que acompanha minhas análises. Conheço Rita desde antes da Academia, e fiquei animado em vê-la como parte do elenco. Como personagem Rita é estável, sabe qual é sua proposta pessoal e a defende. Não está ali para atacar ninguém; pelo contrário, somos nós que vamos até ela. O problema em Rita ser Rita é, talvez, a falta de conexão que grande parte do público sinta para com ela. Rita Von Hunty faz parte de uma fina casta da comunidade gay (trecho roubado da opinião de Diego Olivier): é a bicha com conteúdo. Como parte de um grupo limitado, corre o risco de ser mal interpretada. Percebo que Rita não está na competição para vencer, mas para levar uma mensagem ao público. Torço para a vadia com todas as minhas forças, mas sinto que ela não será a vencedora. O preconceito que ainda permeia nossa comunidade nos torna despreparados para adorar uma rainha como Rita. No desafio principal foi impecável. Como atuação: a melhor.

Yasmin Carraroh é carismática e engraçada, e tem potencial para ser uma estrela, mas ainda há que se trabalhar a presença de palco. A bicha é alta, negra e tem tudo para dominar um palco. Então por que não o faz? O que me incomoda na Yasmin é apenas uma coisa, um detalhe fácil de ser corrigido: ela não se mantem no personagem Yasmin 100% do tempo. Quando está ouvindo suas críticas, sua postura é a de um menino, e eu não quero ver o out of drag delas do momento em que Silvetty apresenta o início do desafio principal até o final do episódio. O workroom está lá para isso, para nos aproximar do lado humano da drag. No desafio Yasmin arrasa mais uma vez com sua veia cômica e artística. Rouba a cena. "Eu sou caricata" me matou. As referências "Partido das Travestiiiixxx", "McDonalds" e "Meu precioso" são toques de alguém que sabe o que está fazendo, mas o "E é isso, gente" no final acaba com a ilusão. Gostei da Yasmin desde seu vídeo de apresentação (Olha que que eu vou levar, ó **batendo a faca na mão**), e o carisma e talento mencionados fazem dela uma forte concorrente à final.

Musa caiu bastante desde o início. Me incomodou quando entrou, me animou nos looks iniciais, me conquistou na dublagem do segundo episódio, mas desde então vem deixando a desejar. A postura firme que Musa trazia no começo perdeu a estrutura diante dos desafios seguintes. Atuação exige timing, autocontrole. Musa parece ter deixado o nervosismo falar mais alto nos momentos mais importantes, o que acabou deixando-a em desvantagem em relação às concorrentes. No desafio principal, ela até tenta, mas não é suficiente. Não há disciplina para respeitar os limites do palco, esbarrando na frente das companheiras, esbarrando nas próprias palavras, sem seguir um rumo definido, com nexo. Mereceu estar na Recuperação.


Lavynia Storm me ganhou quando entrou naquele workroom no primeiro episódio distribuindo raio pra tudo quanto é lado. O look Angel do primeiro desafio fez meu amor crescer. Depois pareceu dar uma caída, uma apagada. Parecia estar sendo comida viva em meio à fúria das concorrentes. Seu brilho ressurgiu no stand up, na encenação de A Morte do Cisne, mas neste quarto episódio me deixou embucetado quando adotou a pose derrotista, mostrando-se fraca. Pensei "Já perdeu". Mas sua performance do desafio principal me fez rir. Me fez rir muito. "Hoje eu tô fervorosa!" "Cadê o demonho?" Morri. O look estava on point. Vi que, na hora H, Lavynia deixou o conformismo de lado e lutou com as armas que tinha. Mostrou-se forte. Não possui a firmeza de uma atriz, e talvez seja isso que a desfavoreceu. Contudo, não mereceu o título de uma das piores da semana.


Recuperação: Musa Vs Lavynia

Dublando Cha Cha Boom (na qual estou viciado), de Nicky Valentine e Breno Barreto, Musa e Lavynia batalham, e há uma injustiça aí. Musa é boa, mas Lavynia é destruidora. Musa ainda consegue ir para o camarim trocar de roupa (ainda bem — fiquei imaginando a vinhada dublando com aquela roupa de tia), mas mesmo assim se atrapalha com a peruca e entrega uma performance fraca. Lavynia, por outro lado, mostra a que veio. É a melhor dublagem da Academia até o momento. Eu babei — literalmente. Mais uma vez chorando (Ô bicha chorona!), Lavynia continua, enquanto Musa faz as malas. No discurso final, durante os créditos, Musa fala uma das piores coisas que alguém pode falar quando é eliminado de um reality: "Eu não consegui mostrar tudo o que eu queria. Acho que se eu ficasse, nas outras provas eu ia conseguir mostrar tudo o que eu queria." ¬¬ Por favor. Se depois de quatro episódios (tendo ficado em Recuperação em dois seguidos) você não conseguiu mostrar tudo o que queria... Respeito Musa como artista, mas neste episódio ela cagou pela boca — e não foram poucas vezes. Ainda assim quero vê-la performando ao vivo.

Estamos chegando na reta final. Dois episódios restam. A corda está apertando em alguns pescoços. Estou temendo pelas minhas favoritas. Espero que a conclusão de Academia de Drags não seja como os finais dos livros de Stephen King. Se for, dia 5 estarei na Blue Space pra quebrar tudo.

Mentira.

Nenhum comentário:

Postar um comentário